A graça da família - Dom Alberto Taveira
“Pela fé, embora Sara fosse estéril e ele mesmo já tivesse
passado da idade, Abraão tornou-se capaz de ter descendência, porque considerou
fidedigno o autor da promessa. E assim, de um só homem, já marcado pela morte,
nasceu a multidão comparável às estrelas do céu e inumerável como os grãos de
areia na praia do mar” (Hb 11, 11-12). Abraão é considerado o “Pai da Fé” pelas
três grandes religiões monoteístas, o Cristianismo, o Judaísmo e o Islamismo.
Para elas, a experiência da presença de Deus tem sua fonte no alto, é
revelação, cuja iniciativa é do próprio Senhor. A fé, certeza a respeito
daquilo que não se vê (Hb 11, 1), introduz nas realidades humanas um horizonte
aberto de proporções inimagináveis. Abraão se encontra presente, quando apostou
tudo em Deus, na multidão dos homens e mulheres que, nas sucessivas gerações,
volta seus olhos para o alto e para frente.
A graça da paternidade e da maternidade, experimentada por
Abraão e Sara, há de ser posta em relevo em nosso tempo, pois, de fato, “os
filhos são herança do Senhor, é graça sua o fruto do ventre” (Sl 127, 3).
Queremos oferecer, como profecia de um futuro digno para a humanidade, o
presente de famílias cristãs consistentes. A contribuição genuína dos cristãos,
neste campo, é a família una, fiel e fecunda. Graça e desafio! Aceitar formar
famílias segundo esta proposta é antes de tudo uma vocação a ser descoberta e
alimentada. Homem e mulher, pois assim foi criado o ser humano (Gn 1,27), são
tocados pelo amor de Deus para serem seus sinais. A resposta, desafio a ser
assumido, é construída durante a vida toda.
O coração humano não foi feito para ser dividido em vários
amores. Corpo e alma, com todas as suas potencialidades, doados como sinal do
amor de Cristo e da Igreja. Chama-se “sacramento” do Matrimônio! Descobrir a
pessoa à qual será entregue a própria vida, não como um título de propriedade a
ser adquirido, é a grandeza do casamento cristão. Trata-se de uma forma de
consagração a Deus! Acreditar que os dois, unidos diante do Senhor, mostram o
próprio Deus às outras pessoas e ao mundo. Nosso mundo clama por testemunhas
consistentes de tais valores. Os casais cristãos descubram de novo a beleza do
que receberam do Senhor e assumiram como vocação.
Com certa frequência aparecem estatísticas sobre a
fidelidade e a infidelidade entre os casais. Parece uma propaganda das
aventuras infelizmente existentes, que podem suscitar justamente uma
banalização de uma das graças do matrimônio cristão. Desejo homenagear os
casais que não submetem sua própria intimidade a perguntas que os expõem na
praça pública. Sintam-se reconhecidos todos os casais fiéis, e são muito mais do
que se divulga! Saibam que a Igreja faz festa com eles por conservarem, no
verdadeiro tabernáculo que é sua vida conjugal, o tesouro da fidelidade,
prometido com plena liberdade quando seu amor se tornou Sacramento. Não fica
esquecido pelo Senhor o dom de suas vidas!
Por falar em exposição, sim, os casais cristãos têm algo a
mostrar! Trata-se dos filhos, testemunhas da fecundidade do amor verdadeiro. Já
se disse que o amor conjugal não é olhar um para outro a vida inteira, mas
olharem os dois numa mesma direção! Olhar para o alto, participar da graça
criadora de Deus, gerar filhos para a Igreja e para o mundo! É dignidade a ser
sonhada e construída pelo homem e a mulher que se unem no Sacramento do
Matrimônio. É graça a ser pedida pelos que se preparam ao Casamento.
Tudo isso encontra seu sentido na fé, fundamento de
realidades humanas assumidas nesta terra, como pessoas que veem o invisível. Há
muita gente pronta para descrever os problemas das famílias. A nós, na Igreja,
cabe a tarefa de proclamar um verdadeiro evangelho da família, reconhecida como
boa nova para o nosso tempo.
Daí nasce o convite aos jovens vocacionados ao matrimônio,
para que empreendam um caminho de discernimento e preparação correspondentes à
grandeza do sacramento que desejam abraçar. Entrem na escola do amor
verdadeiro, treinem a capacidade de escuta e acolhimento, exercitem a saída de
si mesmos para dar espaço à outra pessoa. Peçam a Deus a graça de descobrirem a
quem deverão entregar totalmente suas vidas. Sejam anunciadores de novas
famílias, renovadas no Espírito Santo.
Aos casais cristãos, chegue o convite da Igreja a edificarem
cada dia seus lares sobre o fundamento da fé, de modo a transmitirem valores
consistentes aos filhos e os testemunharem à sociedade. Deus lhes confiou muito!
A Evangelização de seus filhos começou quando estes foram gerados no amor,
deixando neles uma marca indelével. Continuou quando vocês lhes ensinaram os
rudimentos da fé cristã. Benditas foram as orações que lhes foram ensinadas!
Deem graças ao Senhor porque vocês os apresentaram à Igreja para os
Sacramentos, quando os encaminharam à Catequese. Aliás, vocês foram os
primeiros catequistas! Deus lhes pague e confirme sua vocação na transmissão e
educação da Fé Cristã na Família, como quer celebrar a Semana Nacional da
Família. Deus seja louvado pelos valores cristãos que existem em nossas
famílias, santuários da fé e da vida!
Com as famílias e pelas famílias, rezamos confiantes no dia
dos pais: “Deus eterno e todo-poderoso, a quem ousamos chamar de Pai, dai-nos
cada vez mais um coração de filhos, para alcançarmos um dia a herança que
prometestes. Amém!”
Texto: Dom Alberto
Taveira Corrêa / Arcebispo de Belém (PA)
Fonte: cnbb.org.br/site/articulistas/dom-alberto-taveira-correa/12592-a-graca-da-familia
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